T Ó P I C O : #Job to be done: Afinal de contas, o que é isto (e como se aplica ao meu negócio)?
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#Job to be done: Afinal de contas, o que é isto (e como se aplica ao meu negócio)?
Autor: Leonardo Assad Aoun
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Último comentário neste tópico em: 01/10/2018 16:37:25
Leonardo Assad Aoun comentou em: 01/10/2018 16:54
Job to be done: Afinal de contas, o que é isto (e como se aplica ao meu negócio)?
Por Marcelo Nakagawa
Antes de começar a ler o texto, faça uma lista (mental) de 10 concorrentes da CacauShow...
Agora, olhe a foto abaixo e responda:
- A foto foi tirada em qual ambiente?
- O que uma máquina de Nespresso está fazendo aí?
Como já deve ter prestado atenção em todos os detalhes até aqui, respondeu corretamente as duas questões: Sim, é uma sala. E sim, a máquina de Nespresso funciona como um objeto de decoração descolado (bacana, top) e um símbolo de status.
Desta forma, já entendeu o conceito de Job to be Done, estruturado e popularizado pelo Prof. Clayton Christensen (Harvard Business School), que esclarece que os clientes não compram o produto ou serviço em si, mas as tarefas (jobs) que entendem/percebem que este produto/serviço realiza para eles.
No caso da Nespresso as tarefas (jobs) compradas pelo cliente vão além de um bom café espresso (ou expresso, você decide). Esta tarefa (job) já era realizada pelas cafeteiras "italianas" e "expressas". Mas quem as têm sabe que nem sempre o café moído está fresco, que é preciso colocar água e ficar esperando o aquecimento e o pior, dá um trabalhão limpá-las. Por isso, a minha cafeteira italiana, por exemplo, deve estar em algum canto escondido nas gavetas da cozinha e a máquina de expresso, que ganhei no casamento, eu não sei onde está. Por isso, o cliente da Nespresso também compra as tarefas (jobs) de conveniência, limpeza, organização, rapidez. Mas, de certa forma, estas tarefas também já eram realizadas pelas máquinas que utilizavam sachês de café. Por isso, o(a) cliente que compra Nespresso também está comprando variedade de opções, embalagens elegantes, sabores incríveis, lojas (quando adquiridas em lojas da marca) sofisticadas, entre outras tarefas, que o(a) deixam maravilhado(a). Por fim, a lista de tarefas (jobs) que o cliente compra não para aqui. Principalmente no início, a máquina de Nespresso era um símbolo de status, de apreço com o convidado e um objetivo de decoração, tanto que ficava na sala das residências e à mostra, nas salas de reuniões das empresas. E estas tarefas não eram executadas apenas pela máquina ou pelas cápsulas. As embalagens também atendiam tarefas (jobs) de status, apreço, decoração.
Em resumo, a Nespresso realiza quatro níveis de tarefas (jobs) para o cliente:
- Um ótimo café (Job funcional - a tarefa mais elementar, básica. É o produto ou serviço em si.)
- De forma conveniente, limpa, organizada, rápida (jobs operacionais - tarefas que facilitam o consumo do produto ou serviço. É a solução que o cliente espera.)
- É inteligente em todo o processo, também é inspiradora pela combinação de variedade, cores, cheiros, sabores, beleza das lojas, embalagens e revigorante não só pelas propriedades do café em si mas também pela recompensa da "auto premiação" pessoal. (jobs emocionais - tarefas que fazem com que o usuário/cliente se sinta melhor. É a experiência vivenciada, de fato.)
- E que vale a pena não só mostrar mas destacar para clientes e convidados como uma demonstração de apreço, (pelo menos no início) um símbolo de status e um objeto de decoração. (jobs sociais - tarefas que fazem com que o usuário/cliente queira compartilhar sua experiência com os outros.)
Nesta abordagem do Job to be Done é possível entender que o valor pago pelo Nespresso não é o dos jobs mais básicos (café expresso de forma conveniente, limpa, etc.), mas dos jobs mais sofisticados (inteligência, inspiração, recompensa pessoal, apreço com convidados, decoração, símbolo de status).
Se entendeu o conceito de Jobs to be Done, sabe quem são os principais concorrentes da CacauShow...
Mas se acha que a CacauShow concorre principalmente com a BrasilCacau, Kopenhagen ou outra marca de chocolate, veja o vídeo a seguir em que o próprio Alexandre Costa, fundador da CacauShow explica quem são seus concorrentes.
Até 1960, as empresas acreditavam que vendiam produtos e serviços. Parece algo tão óbvio que até hoje há muitas empresas que acreditam nisso. Mas a edição de Julho/Agosto deste ano da revisa Harvard Business Review trouxe o artigo Miopia de Marketing do Prof. Theodore Levitt. Este artigo apresentou um dos dez conceitos mais importante da administração de todos os tempos. E é uma pena que muitos executivos ainda desconheçam a sabedoria deste estudo. De uma forma mais ampla, Levitt tentou responder uma pergunta simples: Por que as maiores empresas de um século, não se mantiveram assim no século seguinte? No Século XIX, as empresas ferroviárias estavam entre as maiores dos Estados Unidos, mas não se mantiveram assim no Século XX. O motivo deste insucesso é óbvio agora, mas não naquele momento: As empresas ferroviárias se enxergavam no mercado de....

Tente completar a frase antes de seguir lendo o texto...ferrovias e não no de transporte. E por esta razão, continuaram investindo para serem as maiores e melhores empresas... ferroviárias e não se atentaram ao surgimento e evolução de várias outras soluções de transporte como o rodoviário e aéreo. Na abordagem do Prof. Theodore Levitt as empresas são míopes quando entendem que vendem produtos (ou serviços) e seus concorrentes são àqueles que vem (exatamente) os mesmos tipos de produtos. Desta forma, uma empresa não está no mercado do seu produto, mas no benefício (ou solução) comprado do seu produto. Atente-se para o fato de que a empresa não vende o produto. É o cliente que compra o benefício/solução oferecido pelo produto.
Por isso, o primeiro slogan que a CacauShow utilizou em sua marca não era apenas visionário, mas também sábio: Qualidade sempre presente.
Com o tempo a CacauShow passou a investir muito mais em novos produtos e, principalmente, em embalagens lindas, criativas e/ou sofisticadas para serem compradas como uma opção de presente ou de "lembrancinha". A CacauShow começou a competir com vale-presente, livro, CD do TerraSamba e depois com O Boticário, Contém 1g, Imaginarium e, atualmente, até como as Havaianas ou Mr. Beer.
Se quiser conhecer mais sobre Miopia de Marketing, veja o artigo Você é Míope? que escrevi para a Harvard Business Review Brasil
É uma pena, mas muitos executivos, empresários e empreendedores ainda acreditam que estão no mercado do produto ou serviço que tentam vender, e não da sua solução que é comprada...
Mas a partir da década de 1980, muitos executivos, empresários e empreendedores perceberam que o cliente não comprava apenas uma solução, mas uma experiência. Desta forma, enquanto algumas empresas ainda querem ser "sinônimo de brinquedo", o negócio da Lego é "inspirar e desenvolver os construtores do amanhã" e há muitas dimensões, experiências e perspectivas possíveis para alcançar este objetivo.
E assim o mantra "O cliente compra experiência" se tornou um lugar comum nos discursos das empresas com destaque para a liderança de Howard Schultz nisso. Ao assumir as operações da Starbucks no meio da década de 1980, Schultz conseguiu algo que até hoje seus concorrentes não entendem: Como abrir e manter 28.218 (julho de 2018) em 72 países, cobrando o que cobra e com as lojas cheias? Ou para os concorrentes brasileiros: Como abrir e manter cheias as 14 lojas na região da Av. Paulista?
Muitos que gostam da Starbucks sabem que não estão indo lá para comprar café. Mesmo os concorrentes sabem disso. Todos irão mencionar que a "Experiência Starbucks" é o grande diferencial da rede. Outros ainda lembrarão da "Experiência Disney" que vivenciaram, principalmente, na Disneyworld em Orlando, Estados Unidos. Há dezenas de livros que falam da obsessão da empresa em tangibilizar a Experiência Disney para os convidados (como são chamados os visitantes dos seus parques) e até um instituto que ensina isto para qualquer interessado.
Mas mesmo diante de tantas informações, muitas organizações ainda fracassam em criar experiências de consumo que sejam realmente percebidas e valorizadas pelos seus usuários e clientes.
É aqui que o conceito de Job to be Done pode ser útil! Em 2007, o Professor Clayton Christensen da Harvard Business School publicou o Finding the Right Job For Your Productna revista MIT Technology Review onde explica que o cliente compra produto/serviço, solução e experiência, mas, daí o achado, também compra tarefas (jobs) específicas. Quando uma experiência, solução ou produto/serviço é percebido desta forma, a empresa tem condições de, não só planejar, mas fortalecer aspectos que são críticos para o usuário/cliente mas que não são identificados nas abordagens tradicionais.
Para ilustrar o conceito de Job to be Done (JTBD), o Prof. Christensen costuma apresentar um caso simples de um projeto que liderou como consultor para uma grande rede de fast food. O objetivo era trivial: Como aumentar as vendas de milkshake? Mas antes de seguirmos em frente, responda a questão abaixo:
Em qual período (horário) você acredita que a loja vendia mais milkshakes?
Realizaram pesquisas junto aos consumidores, mas as sugestões implantadas não surtiram efeitos. Fizeram diversos levantamentos estatísticos e um aspecto chamou a atenção: Metade das vendas de milkshake eram feitas antes das 8 horas da manhã por pessoas que vinham sozinhas, faziam o pedido "para viagem" e saiam rapidamente da lanchonete. Daí, um consultores fez uma pergunta sob uma perspectiva diferente: Por que você compra um milkshake? Depois, reformularam a questão e a fizeram de outra forma: Da última vez que esteve na mesma situação, como resolveu a situação? Por esta perspectiva, perceberam que os clientes não compravam o milkshake pelo produto em si, mas pelas seguintes tarefas (jobs) que o milkshake (e apenas ele) realizavam para eles:
- Não estavam com fome ainda, mas estariam por volta das 10 horas.
- Precisam de algo que os deixassem "alimentados" durante toda a manhã.
- Também era algo gostoso, demorava para ser consumido e ainda dava para ficar brincando com o canudo.
- Além disso, era algo fácil de manusear, não sujava ou deixava resíduos.
- Há um espaço feito para colocar o copo no carro com segurança.
- Por fim, era algo para entreter durante a (longa e tediosa) viagem até o local de trabalho.
Para realizar as mesmas tarefas, os compradores de milkshakes já tinham tentado bananas, mas era muito rápido para comer e também os deixavam com fome rapidamente. Tentaram donuts, mas também ia rápido, deixava migalhas na roupa. Também comeram bagels, mas eram secos, sem gosto. E ainda era necessário fazer malabarismo para dirigir o carro e passar a geleia no pão. E se o telefone tocasse era o caos. Tentaram doces, mas se arrependeram.
A partir da constatação de que os clientes compravam estes jobs, a rede passou a caracterizá-los melhor, destacando-os e aumentando o valor percebido e com isso, as vendas.
O conceito de JTBD pode ser aplicado para qualquer tipo de negócio, dos mais simples aos mais complexos, dos mais tradicionais aos mais inovadores, dos B2C aos B2B. A lógica é que o cliente compra mais do que produto/serviço, solução e experiência. Ele(a) compra tarefas específicas.
Para dominar o conceito de Jobs to be Done, eu costumo mostrar a figura abaixo e perguntar o que é a linha rosa?
Se quiser ver o que é a linha rosa, veja este vídeo e tire suas próprias conclusões!
Em 2007, quando o iPhone foi lançado, Olli-Pekka Kallasvuo, o então presidente mundial da Nokia, que liderava totalmente o mercado de telefones celulares (maior do que a somatória de todos os seus concorrentes), declarou que a entrada do novo celular da Apple não demandaria nenhuma mudança nos produtos ou modelo de negócio da sua empresa, afinal, seus clientes estavam muitos satisfeitos com os telefones celulares da Nokia.
O que ele não percebeu foi que o iPhone não iria competir com a Nokia no quesito telefone celular ou mesmo como smartphone...
Ser um bom telefone ou smartphone é apenas a necessidade mais elementar do cliente. A pessoa que fica na fila esperando para comprar um iPhone, na verdade, tem outras demandas. O Prof. Christensen chamou essas necessidades, demandas, desejos, dores, etc. de Jobs to be Done. Em português, tarefas que devem (ou deveriam) ser executadas pelo produto ou serviço, caracterizando a "solução", mas em um contexto mais amplo, definindo uma "experiência" de consumo.
Para compreender melhor estes Jobs to be Done, eu costumo separar em quatro categorias:
- Job funcional: a tarefa mais elementar, básica. É o produto ou serviço em si.
- Jobs operacionais: são as tarefas que facilitam o consumo do produto ou serviço. É a solução que o cliente espera.
- Jobs emocionais: são tarefas que fazem com que o usuário/cliente se sinta melhor consigo mesmo. É a experiência vivenciada, de fato, e percebida como algo vantajoso, inspirador e/ou valioso pelo usuário/cliente.
- Jobs sociais: são as tarefas que fazem com que o usuário/cliente se sinta melhor perante os outros e/ou que fazem com que queira compartilhar sua experiência com os outros.
Com esta lógica em mente, perceba quais são os Jobs to be Done do iPhone da Apple...
A imensa maioria dos produtos e serviços que estão no mercado entrega apenas os jobsfuncionais e operacionais. Neste caso, a competição é por quem vende mais barato. Algumas poucas também conseguem entregar com consistência alguns jobs emocionais também. Quando se chega a este nível, a competição é por valor percebido. E são raros os casos de empresas, produtos ou serviços que foram pensadas para entregar os jobs sociais. A competição aqui é por status e quem atinge este nível com autenticidade, em geral, não vende, é comprada.
Se entendeu que uma empresa não vende um produto ou serviço. É o cliente que compra! E ele(a) compra a solução, o benefício do produto ou serviço. E que o cliente não compra apenas a solução, ele(a) compra a experiência! Mas na verdade, a experiência é composta de Jobs to be Done, tarefas específicas do produto/serviço que são percebidas, valorizadas e, quando se chega ao nível máximo de job (social), também são difundidas pelos clientes!
Analise novamente a figura inicial deste artigo e perceba os jobs de uma marca de café comum, da Melitta, da Starbucks e da Nespresso...
Agora é com você... Defina e valide os Jobs to be Done do seu negócio!
Link para o exercício acima em pdf.
Caso queria se aprofundar neste assunto, consulte a ferramenta Jobs to be Done para Empreendedores (http://bit.ly/jobs-to-be-done) que preparei para o Movimento Empreenda da Editora Globo.
E mais um detalhe: Muitos ficam na dúvida se o conceito de Jobs to be Done só funciona para produtos e serviços B2C, ou seja, produtos e serviços direcionados para pessoas físicas como bens de consumo, serviços financeiros de varejo ou soluções digitais como aplicativos, marketplaces ou comércio eletrônico. Na verdade, o JTBD é ainda mais importante para as soluções B2B, produtos e serviços voltados para empresas! Pois no final do dia, não há soluções B2C ou B2B (ou outras variações como B2B2C, B2G). As relações serão sempre com pessoas que demandam jobs funcionais, operacionais, emocionais e sociais!
Bons negócios!!!
Marcelo Nakagawa é Professor de Inovação e Empreendedorismo do Insper, FIA, Fundação Vanzolini, Butantan, entre outras instituições. É coordenador de inovação da FAPESP. É consultor de inovação de várias grandes corporações e entidades governamentais como Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC). É colunista de empreendedorismo do jornal O Estado de São Paulo. É membro dos conselhos da Anjos do Brasil e CIETEC. É membro do Conselho Executivo de inovação da Cyrela Commercial Properties (CCP). É Doutor em Engenharia de Produção (POLI-USP), Mestre em Administração e Planejamento (PUC-SP) e graduação em Administração de Empresas (FEA-USP). Mais de 25 anos de experiência executiva nos mercados bancário, consultoria estratégica, venture capital, inovação tecnológica, private equity e educação. Mais informações em https://www.linkedin.com/in/marcelonakagawa/
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